domingo, 14 de abril de 2013

Thatcher: radicalismo e resultados



Ex-primeira-ministra britânica deixa legado econômico e rótulo de líder



TATIANA NOTARO

Margaret Thatcher recebeu muitos rótulos por defender posicionamentos e por ter aplicado políticas econômicas radicais enquanto primeira-ministra da Inglaterra, entre 1979 e 1990. Sua morte, na última segunda-feira, aos 87 anos, reaviva questões que a fizeram ser, ao mesmo tempo, a "dama de ferro" e "o homem mais importante da Inglaterra" (como a ela se referia o ex-presidente norte-americano Ronald Reagan). Em seu Thatcherismo, Margaret foi uma líder firme e uma gestora controversa. Mas não por acaso, ganhou três eleições seguidas defendendo, entre outras coisas, a redução do papel do Estado (inclusive, cortando programas sociais custoso e poucos resolutivos), a austeridade fiscal e a privatização de estatais.

Ainda no início da década, Margaret Thatcher era contrária a uma moeda única na Europa e ao molde que hoje se vê na União Européia. "Ela defendia que quando um país abre mão da sua moeda, perde autonomia na política monetária, que inclui decisões referentes a taxa de juros, por exemplo. Era contrária a uma política monetária única para países tão diferentes", explica o professor da Faculdade dos Guararapes, mestre e doutorando em Ciências Políticas e Relações Internacionais, Jorge Troper. Esse temor na perda da soberania não estava (ou está) arraigada apenas em Margaret Thatcher, mas é uma condição forte na liberalista cultura inglesa, presente naquele país desde a Magna Carta de 1215. Vale lembrar que a Inglaterra manteve sua moeda em detrimento ao Euro. "Este governo não tem a intenção de abolir a Libra Esterlina. Acredito que tanto o Parlamento como a moeda servem muito bem a este país e ao resto do mundo", disse Thatcher, no fim do seu governo, no que ficou conhecido como discurso do "não".

"Margaret era uma liberal irredutível e a grande responsável pela revitalização da economia do seu país", descreve Troper, quando perguntado sobre o perfil econômico da ex-primeira-ministra. Ele rememora que em 1979, ano do início do Thatcherismo, a inflação na Inglaterra era de 25% ao ano e o número de desempregados chegava a um milhão de pessoas. "Em 1977, recorreram ao FMI (Fundo Monetário Internacional), o que foi uma humilhação para eles". Thatcher fez mudanças radicais, mas os resultados visíveis demoraram. No início dos 1980, havia três milhões de desempregados na Inglaterra; em 1984, veio uma onda de paralisações. "Ela dizia que era tudo causado pela situação em que o país se encontrava. Ela fez uma desregulamentação do setor financeiro, privatizou empresas que davam prejuízos, reduzindo o tamanho do Estado, e cortou impostos. E quando questionada, dizia: 'esta senhora não é de recuar'", diz Troper. Sucessores de Margaret, Tony Blair e Gordon Brown não reverteam as principais reformas da ex-primeira-ministra.

Troper cita, entre as grandes polêmicas do Thatcherismo, os entraves com mineiros, em 1984. A ex-primeira-ministra defendia que o Reino Unido não tinha mais que produzir carvão, mas computadores. "O nível de vida do país não seria mantido com essa atividade. Na década de 80, ela já tinha esse insight", afirma o professor. E como veio "de baixo", "filha do verdureiro", Margaret costumava dizer que administrava o governo como seu pai fazia na quitanda: gastando dentro daquilo que arrecadava. Em meio disso, organizou contas, mas fez cortes radicais, como o de leite. "Ela transformou a Inglaterra, mas não se pode esquecer que mudanças sempre atingem a alguns grupos. Como aconteceu, no caso, com os mineiros.

Embora mantenha sua Libra, a Inglaterra não está estéril na crise. "Apesar disso, não tem o comprometimento da Alemanha, que tem compromissos com o bloco, nem está subordinada ao Banco Central Europeu e ainda mantém soberania". De toda forma, Margaret Thatcher foi a mais importante líder do Reino Unido desde a morte de Winston Churchill (primeiro-ministro britânico até 1955) . "Independentemente de concordar ou não com os posicionamentos de Margaret Thatcher, não se pode questionar seu vigor político e a sinceridade com a qual ela se posicionava. Coisas que fazem falta hoje".

NO BRASIL
"Falar de liberalismo no Brasil, hoje, ainda é como falar um palavrão", reflete Troper, "mas gostem ou não de Collor (o ex-presidente do Brasil, Fernando Collor), foi no governo dele uma decisão econômica importante: o processo de abertura pólítica", defende. Era uma época de economia protegida quando, por exemplo, o brasileiro tinha carros caros e ruins por causa da falta de concorrência. 

Troper ainda diz que os moldes Thatcheristas são vistos no governo de Fernando Henrique Cardoso, "que não era um neoliberal, mas um social-democrata", e, mesmo assim, percebeu que o Estado não poderia manter estatais pouco produtivas. "Foi no governo FHC que o Brasil viu muitas privatizações de empresas públicas. Excesso de estatais é uma coisa pré-histórica. Essas privatizações ocorrerm em outros países também".

Troper concorda com o que escreveu o economista Carlos Alberto Sardenberg: "uma Thatcher, hoje, seria perfeita para o Brasil. Mas uma Thatcher em grande estilo: líder de partido, ganhando eleições com uma agenda liberal. Seria bom até para modernizar a cultura esquerdista amplamente dominante no país. Isso aconteceu na Inglaterra e, nos 80 e 90, em boa parte do mundo, inclusive no Brasil. Precisava acontecer de novo".

quarta-feira, 3 de abril de 2013

Hoje, a fala de quem (sempre) ouve

Um jornalista só pode ser alguém de ideais. Quer mudar o mundo, quer informar, quer, no mínimo, tapar um buraco na rua de quem ainda usa a Imprensa como escudo, como arma. Se ele não for um idealista, resta-lhe pouco: ou é um sem-vergonha ou preguiçoso. Como dificilmente será rico ou reconhecido, ou fica porque ama ou por malandragem.

Trabalhar em redação exige despego afetivo, financeiro. Exige que você explique o que não consegue entender, que mostre verdade quando queria esconder-se, que lute (quase) anonimamente por uma sociedade inteira. Porque quem é Jornalista de verdade, de peito, de sangue, de DRT, corre o Sertão atrás de Dilma, passa por tiroteio como um inatingível, ouve confissão de assassino "com exclusividade", faz denúncia (alheia) na raça, mesmo que não possa defender a si mesmo. Entra em incêndio, testa carro, checa número de mortos, dá a escalação de time. Não é bancar o mártir, é que não tem outra saída. Infelizmente.

Jornalista é um cidadão que ouve de um prefeito de interior que ele não pode dar informações sobre a folha de pagamento do município por se tratar de "um assunto muito pessoal"; que tem vontade de mandar prender o homem, mas precisa ter sangue frio para dizer: "o senhor está enganado, o dinheiro é público". Jornalista é o personagem camuflado que entra em velório, que vai em cena de crime e acaba consolando os parentes, que vislumbra olhos de súplica e sente o coração bater mais forte.

Repórter é bicho de rua. É quem senta para conversar com secretário de governo ou com presidente de multinacional com o mesmo respeito e atenção que atende a um leitor que quer ajuda para receber da loja trapaceira o que lhe é de direito. É o esquema "sua satisfação ou o dinheiro de volta". É ouvido social, público, para ouvir desabafo de estudante, de operário, de empresário. Leva pedrada, bala, carreira da polícia. É justiça e bandido - depende dos olhos de quem lhe vê.

Redação, acredite, é o paraíso daqueles que vêem o real Jornalismo (impresso, televisionado, de rádio, online, literário, acadêmico, premiado...) como a arma mais fidedigna de uma sociedade. O instrumento maior, justo, se fosse ideal. Matéria assinada é peça da História, fonte conquistada é confiança e parceria, leitor instruído é meta. Imprensa não podia ser negócio, é contra a sua natureza.

Qualquer coisa que não seja assim, acredite, não creia. Não é Jornalismo.

Hoje a Folha de Pernambuco faz 15 anos, mas é disso aqui que eu estou falando:

Torgentil Alves, leitor, com sua a primeira edição da Folha, de 3 de abril de 1998