sábado, 30 de maio de 2009

E onde vocês moram mesmo? **


Estar no lugar certo na hora certa pode mudar a sua vida, concorda? Num conceito não tão drástico assim, estar no lugar certo na hora errada também tem suas consequências. Pois bem.

Dia desses, fui ao oftalmologista para ele me receitar novos óculos para substituir os velhos e arranhados. Entreguei os documentos à secretária e disse a Tardelle:

- Bora sentar ali em cima? - me referindo ao salão, logo depois das escadas.
- Não, bora ficar aqui mesmo. - respondeu, já sentadão.

Aí peguei minha Rolling Stones do mês e tentei começar uma leitura. No lugar onde estávamos sentados havia duas cadeiras vagas, uma de cada lado. Aí senta uma senhora do lado dele e puxa conversa:

- Tá cheio aqui, né?
- É, né? - Responde, meio sem puxar muito papo, como lhe é peculiar.

Pronto, foi a deixa. Eu pensei que enterrar minha cabeça na entrevista com Caetano Veloso ia me salvar, mas eis que um senhor, sentado do meu lado, também puxa conversa e emenda uma piada:

- Eu assisti há muito tempo atrás no A praça é nossa...

Foi um esforço surreal para parecer simpática, pelo menos por fora. Mas aí foi a deixa também, e ficamos os dois, incumbidos de dar atenção aos dois senhores que, saberíamos dali a alguns minutos, eram um casal.

Dona Maria José (ou Mazé), 73 anos, era super falante, daquelas senhoras espaçosas, engraçadas. Pois não é que ela achou de se engraçar com meu namorado?


- Ela é ciumenta? - Perguntou Dona Mazé a Tardelle, referindo-se a mim.
- É, muito. - Respondeu ele, rindo.
- É... ela tem que ser mesmo. Um rapaz bonito desses...


Aí ela me puxa pelo braço e solta:

- Se eu fosse mocinha, tu tinhas deixado eu conversar com ele?
- Claro que não, né? – respondi.


Dona Mazé deu uma gargalhada...

- Mas do jeito que as coisas estão hoje, - continuou – você deveria ter medo!

- E como estão as coisas hoje?

- Você não viu Elza Soares? Ela tem mais de 70 também e namora um menino de 25.


Ri pra não dar um fora. Fiquei com medo do Estatuto do Idoso.


O problema foi que, no meio da graça, a gente começou a perceber algo errado:

- Vocês moram onde? – perguntou a “doce vovó”.

- Aqui perto - respondi.


Em 15 minutos, ela pergunta:

- E vocês moram onde?

- Ali perto do Náutico...


Vamos contabilizar: foram 35 minutos de espera, 30 minutos de conversa. Dez vezes ela perguntou onde a gente mora, outras oito, nossos nomes:

- E como são os nomes de vocês?

- Tatiana e Tardelle...

- Tardelle... que nome diferente. É bonito. Como se escreve?


Mas ela anotou num pedaço de papel pra não esquecer mais. O problema deve ter sido encontrar aquilo lá escrito e não saber do que se tratava... Mas como a própria Dona Mazé repetiu 14 vezes: "Melhor ser falante do que não falar nada, né?"


É...



** Dona Mazé sofre do Mal de Alzheimer, doença degenerativa do sistema nervoso, caracterizada pela demência.

domingo, 17 de maio de 2009

Operação radiola

Estou à procura de uma radiola. Tardelle diz que é coisa de velho e que prefere ipods. Eu não. Eu amo som de vinil, aquele chiado...

Fui no centro da cidade atrás de uma dessas relíquias, até uma rua daqui que tem algumas lojas de móveis, umas funerárias e duas lojas de antiguidades. Numa delas, encontrei várias carcaças do que, um dia, há muuuuito tempo, foi uma radiola. Entretanto, segundo o dono da loja, só uma funcionava. Aí ele tirou pilhas de coisas de cima e desenterrou uma preciosidade: uma radiola quarentona, mala, com duas caixas de som, toca-fitas e rádio AM.

Eu fiquei encantada, aí virei pro dono da loja:
- Quanto custa?
- Seissentos reais. Ela funciona...
- Ah... ela funciona [num tom de desânimo]

E fui embora da loja. No caminho de volta. Tardelle ficou me dando sermão, dizendo que era melhor comprar um ipod.
- Cabe muito mais músicas - ele disse.
- Mas não toca vinil - rebati.
- Ainda bem... - ele disse.
Fiquei calada pra não me aborrecer mais ainda.

Por enquanto, a operação radiola está abortada por falta de recursos.

Agora à noite, tava conversando com Bruno. Ele é adepto ao passado suas velharias musicais e, com certeza, seria muito mais sensível ao meu desejo. Fiz uma busca no Mercado Livre e fui passando algumas coisas pra ele ver.

Eis que uma radiola me chama atenção: rosa choque e por R$ 159,00!!! Já ia dizendo a Bruno que tinha encontrado a minha radiola "nova", mas parei antes pra ler o anúncio direito. Então, tive que dividir com ele a minha frustração:

- Tinha achado uma ótima aqui. Era até rosa e tinha um preço legal. A chamada do anúncio dizia que ela funcionava, mas olha o que diz no rodapé: "A radiola está funcionando (rodando), mas não emite som". - disse.

E Bruno:
- Oxe, deve ser pra surdo!


Roda, mas não emite som



*
*
*
Ps: Alguém conhece alguém que queria vender uma radiola QUE RODE e EMITA SOM?

sábado, 16 de maio de 2009

Prognósticos da vida contemporânea


Entender a arte contemporânea não é das tarefas mais fáceis. Compreender a cabeça de alguém que vive hoje, nesse mundo tão surtado, cheio de mensagens e diversas formas de dizê-las, requer cuidado, senso apurado, hermêutica, doses de sociologia, de antropologia e muita, muita paciência. É um verdadeiro exercício mental - se você simplesmente chega, senta e olha, pouca coisa será captada. O óbvio está bem longe dali.

O pior é que, nesse caso, a culpa não é do receptor da mensagem, nem do emissor [ou do pregador, como acusava o barroco Pe. Antônio Vieira, em seu Sermão da Sexagésima*]. Companheiro, ou se trabalha em equipe, ou não dá. É preciso um esforço mútuo - eles se "contorcem" ao máximo pra te explicar; você fica atento o bastante pra compreender. Nem pisque.

Ok, mas como diria JTeles, não tergiversemos.


Bem, ontem aproveitei o convite de um grande amigo querido e arrastei minha mãe para assistir Geraldas e Avencas, o novo espetáculo [sim, no sentido de adjetivo] do grupo 1º Ato, de Minas Gerais. E, até quebrando parte da minha análise anterior, não foi um esforço [meu] entender.

Geraldas e Avencas sobe ao palco nos corpos de sete bailarinos, todos praticamente impecáveis eu suas performances. Conseguem transmitir totalmente a idéia do espetáculo: a plastificação do ser humano, a era da igualdade medíocre onde tudo o que importa é seguir moldes. Implacáveis moldes, que não perdoam diferenças nem gostos. Implacáveis moldes que acabam massificando tudo aquilo que ousa ser diferente. Não se surpreenda se você acabar encaixando perfeitamente num deles...



A concepção, coreografia e direção do espetáculo é de Suely Guimarães. O corpo de baile é formado por Alex Dias, Ana Virgínia Guimarães, Danny Maia, Luciana Lanza, Júnio Nery, Marcela Rosa e Thiago Oliveira. A [linda] trilha sonora é do [ótimo] Zeca Baleiro, que assim definiu essa parceria:

Vez por outra me pego questionando a razão de ser da arte nestes tempos de cinismo e embrutecimento. Esta parceria com o grupo 1º Ato trouxe alentos pra minha dúvida desesperançada: o veneno seco da poesia na veia, o olhar crítico afiado, uma doce dose de loucura e a vontade impetuosa de ver o mundo respirar em meio a tanta danação. Este é o 1º ato. Outros atos virão.



A qualidade de Geraldas e Avencas também já foi confirmada por vários prêmios:



Prêmio Usiminas/Sinparc

- Melhor espetáculo

- Melhor trilha sonora

- Melhor concepção coreográfica

- Maior público de dança em 2007


Prêmio Sesc/Sated

- Melhor bailarina

- Melhor trilha sonora



Para quem se interessar em ver Geraldas e Avencas, tem a última chance amanhã, às 19h, no Teatro de Santa Isabel, aqui no Recife. Os ingressos custam R$ 20 e R$ 10. A censura é livre.




* Sermão da Sexagésima é uma dos sermões escritos pelo Padre Antônio Vieira, português que viveu no Brasil durante o período da colônia. É um dos expoentes da literatura barroca no país.

sexta-feira, 15 de maio de 2009

Ex-titã em novo álbum

Nando Reis, cantor [regular] e compositor [excelente], está às vésperas de lançar seu novo CD, Drês, um registro de inéditas que ele assina junto com o grupo Os Infernais. O álbum traz canções autobiográficas que homenageiam mulheres da sua vida. Para a filha Sophia, Nando compôs Só pra So; para a mãe, Cecília, a faixa Conta (segundo Nando, uma versão da épica Marvin). Adriana, ex-namorada, é cantada em Hi, Dri, Driamante e Drês.

Drês conta ainda com a participação da cantora paulista Ana Cañas [Inclusive, do CD de Ana também é esperada a participação de Nando]. Ela também dá a sua contribuição no novo álbum de Erasmo Carlos, em Um beijo é um tiro e Mar vermelho.

Acho Nando Reis um compositor dos melhores! Vou ficar na expectativa pra ouvir o novo álbum. O único problema de Nando é que a voz dele não ajuda muito. Ele é carismático, bom de palco e excelente letrista e músico. Pra mim, o ideal era o duo Cássia Eller-Nando Reis. Aí, sim...

Particularmente, não curto Ana Cañas não. Depois que a vi [ouvi] cantando no Som Brasil - Cazuza, e ela errou feio a letra de uma música, levei pro lado pessoal... mas é birra. A voz dela merece ser avaliada com mais benevolência. Vou ver se encontro algo.

Bem, é isso. Achei essa novidade excelente.

quinta-feira, 14 de maio de 2009

Roubaram de novo, mas já devolveram

Foi mau. As postagens aqui estão tão devagar que levam furo de todos os lados [não, nem aqui nem em canto nenhum, minha intenção tem a ver com furos]. Deu tempo até de um roubo se desfazer por ele mesmo...

Há uns dias, roubaram outras telas famosíssimas. Aliás, famosíssimos eram seus autores, não as telas em si. Bem, o fato é que levaram dois Cândido Portinari, um Tarsila do Amaral e um Orlando Teruz - quatro belezinhas avaliadas em algo em torno de R$ 3,5 milhões - de uma mansão, num bairro rico de São Paulo. Vejam vocês...

Foto: Patrícia Araújo/G1

Da esquerda pra direita:
1. "Crucificação de Jesus", de Orlando Teruz
2. "O cangaceiro", de Portinari
3. "Retrato de Maria", também de Portinari
4. "Figura em Azul", de Tarsila do Amaral


O mais curioso dessa história não é o roubo em si, mas o fato de terem feito a gentileza de devolver os quadros. Junto, ainda devolveram umas bijouterias que tinham sido levadas no bolo. Segundo o delegado que (não) solucionou o caso, a única avaria sofrida pelos quadros foi a remoção das molduras.

Agora, a grande questão: por qual motivo ladrões iam fazer devolução? Eu estou sem entender até agora e tô achando essa história muito mal contada. Ficaram compadecidos pela pobre família rica... A polícia suspeita que o roubo tenha sido encomendado.

E voltando...

As quatro obras foram roubadas da mansão da família Maksoud no domingo, 10 de maio. "Por causa da pressão da polícia" (!!!), as obras e as bijouterias foram abandonadas em uma rua da zona oeste de São Paulo. Os bandidos ainda ligaram para a Rede Record, avisando a devolução. O prejuízo fico somente em alguns mil dólares e as jóias (verdadeiras).

Insisto na falta de segurança a que estão sujeitas muitos quadros valiosos como estes. Roubos desse tipo já são fato corriqueiro. Esses foram devolvidos, mas e os outros tantos que ninguém (muito menos a polícia) sabe onde foram parar. Qualquer dia, vamos ver uma peça de Portinari sendo leiloada no Mercado Livre.

sábado, 2 de maio de 2009

Roubaram Dalí

Adolescente, de Salvador Dalí, de 1941


Estava lendo num site de notícias que esse quadro fantástico do surrealista Salvador Dalí foi roubado. Segundo a polícia, homens armados renderam funcionários do Museu Scheringa de Arte Realista em Spanbroek, um vilarejo ao norte de Amsterdã. O crime aconteceu ao MEIO-DIA!

Além da tela de Dalí, os ladrões também levaram "La Musicienne" (abaixo), um óleo sobre tela de Tamara de Lempicka.

Brincadeira, né? Junto com os ladrões, deveriam ser presos os responsáveis pela segurança de um museu responsável por obras como estas, que permitem que parte da história da arte mundial acabe nas mãos de marginais. Em plena luz do dia... imaginem sem nunca mais as telas forem recuperadas, o que é bem provável que aconteça. Como fica? Fica o buraco na parede do museu? Fica a perda para as Artes??

Isso já tá virando uma constante. Se já se tem ciência de que grande parte das obras tidas como "originais" não passam de cópias, imagine com esses furtos de obras importantes? Não é possível que algo como esse quadro de Dalí passe despercebido em algum leilão...




** Tamara de Lempicka nasceu Maria Górska, na Polônia (1898 - 1980).