sexta-feira, 25 de março de 2011

O porquê de eu ser eu

Transforme o seu maior hobby em ofício diário e, OU você terá orgasmos intelectuais todos os dias, OU terá dores - principalmente as de cabeça. Falo isso por experiência (profissional) própria.

É comum ter que responder sobre o porquê de ter escolhido minha profissão (e, ademais, de ter reiniciado a vida de graduanda num "singelo" curso de Letras) e costumo dizer que o sentido foi inverso. Certeza absoluta que ela me escolheu, que não havia outra saída pra mim; nem pra ela. 

Aliás, poderia não ter me tornado jornalista nunca, já que a primeira vez que fui "lida" me causou incômodos enormes. Era 1994 e eu, sentimentalóide, escrevi no meu "querido diário" um texto sobre a morte de Senna. Por azar ou sorte, deixei o diário à mostra e minha mãe não só o leu como, comovida com minha veia cronista (ou pelo lado materno dela), ligou pra metade da família. Comoção geral. Indignação minha, que arranquei as páginas e joguei-as fora.

(Lembro que o texto terminava assim: "...e doía no peito aquela tão enorme perda. E com ele, Senna, todo o Brasil morreu". Concorde comigo que isso soa cafona, piegas, mas podemos levar em consideração que eu tinha somente 11 anos. Hoje, acho que isso é culpa da radiola de vovô e sua mania de Lupcínio Rodrigues e Ademar Dultra)

Minha segunda leitura pública foi anos depois, em 98. Era dia de devolução de redações corrigidas no Salesiano. A professora Leodila (ah, Léa! Saudades) chamou todo mundo e nada de me chamar, até que pediu atenção pra ler uma "redação muito bem feita e contundente" e eu gelei quando reconheci meu título. Lembro que o texto falava sobre cidadania e a cada parágrafo, eu ficava mais vermelha e mais me abaixava na cadeira.

No final da época do colégio, estava certa do meu destino indisviável de fazer Letras e me tornar professora de Português. Naquela época, meu amigo Ulisses e eu fazíamos o jornal dos terceiranistas e foi por causa dessa experiência que eu me inscrevi no vestibular pra Jornalismo. Passei, detestei e decidi fazer vestibular de novo pra Publicidade, Medicina ou Fisioterapia - o que passasse primeiro.

Mas não passei. Então, dois anos depois, reabri o curso, voltei, meio sem querer. Não tinha dinheiro pra assumir as despesas, mas nada que o coração materno (e uma bolsa de estudos e uma tia fiadora) não desse jeito. E na primeira vez que entrei em uma redação de jornal, encontrei razão para tudo. Hoje eu (re)entendo isso - todos os dias.

Então tô aqui hoje, assim. Todo dia eu tenho surtos de raiva, quebro a cabeça, escuto coisas que não entendo, descubro, revelo, reporto, aprendo. E sou tão feliz pelo que sou.

É, a gente fez as pazes. =)

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Assim que postei, eis:



Dá pra rir. Aqui, gente, não tem meio termo. É na base do "ame-o ou deixe-o".

sábado, 19 de março de 2011

Desenterrando

Às vezes eu uso música aqui no blog para dar uma refrescada. Passo muito tempo sem postar, então, ressuscito uma velha e boa canção para inspirar.

Então. Dia desses vinha chegando em casa e essa música começou a tocar. Tive que estacionar na garagem e ficar no carro até ela terminar. Fazia tempo que não ouvia e como meu pai sempre curtiu Milton Nascimento, não tive como resistir.

Por tudo, pelos últimos acontecimentos.





"Caçador de mim"

Por tanto amor
Por tanta emoção
A vida me fez assim
Doce ou atroz
Manso ou feroz
Eu caçador de mim
.
Preso a canções
Entregue a paixões
Que nunca tiveram fim
Vou me encontrar
Longe do meu lugar
Eu, caçador de mim

.
Nada a temer senão o correr da luta
Nada a fazer senão esquecer o medo
Abrir o peito a força, numa procura
Fugir às armadilhas da mata escura

.
Longe se vai
Sonhando demais
Mas onde se chega assim
Vou descobrir
O que me faz sentir
Eu, caçador de mim

terça-feira, 1 de março de 2011

A sutil dor da perda

Desde cedo, eu aprendi a "perder". Quando tinha sete anos, um dos meus tios paternos morreu em um acidente de carro. Marcelo tinha 18 anos, era lindo, sorridente, ia prestar vestibular pra Jornalismo. Eu, no alto dos meus sete anos, achava que ele era grande e que a morte era "normal pra gente grande". Eu nem cogitava que ele era tão criança quanto eu.

Naquele episódio, eu me lembro bem, pra nunca esquecer, teve muita dor. Vovó me marcou muito. O choro dela carregava dor e desolação, de quem queria ter protegido e não pôde. Nem poderia... ninguém podia fazer nada. Era o dia de Marcelo, sabe-se lá o porquê, mas era. Sempre tive certeza disso, mesmo no tempo de católica praticante: as coisas terminam exatamente no momento certo. Lembro que na época, fiquei duplamente triste, já que ficara sem festa de aniversário de sete anos. De 16 de junho para 20 de julho, o tempo era curto demais e as feridas estavam todas lá, abertas. Mas ele morreu feliz, viajando com os amigos. Tenho certeza.

Eu cresci lidando com perdas e ganhos, consciliando frustrações e vitórias. O próprio Jornalismo me ensinou isso e me relembra todos os dias. Mas tudo é mais fácil de administrar que a morte - embora não devesse. A morte dá a sensação de fim, sem poréns, sem muita chance pra frustação. Inês já era.

Vi pouca gente ir embora, até hoje. Tio Marcelo foi o primeiro. Em seguida, minhas bisavós, Clarice e Helena - nada mais natural. Anos depois, quando eu já estava adulta, foi vovó Edda, meu doce de banana favorito. Mas a perda de vovó foi leve, ela não me deixou nada que não fosse bom, gostoso e engraçado. Foi dos personagens mais simbólicos do meu início e eu seria incapaz de chorar por causa dela - vovó era riso demais pra merecer lágrimas. Pra ela, sempre, todos os sorrisos.

Mas, então...

Esse post é pra falar de algo interessante e triste que aconteceu hoje. Tenho três primos adoráveis, a quem amo muito, que moram em João Pessoa. Lydia, Samuel e Lucas são daqueles indispensáveis na vida da família. A casa, em dias de festa, fica vazia demais sem eles três (e olhe que somos nove!).

Eles criaram por anos uma calopsita branca cheia de personalidade. Sou capaz de apostar que Patrick (ou "Pratick", como Lucas chamava, mais novinho) pensava que era cachorro e depois se sentia o caçula da família. Andava livremente pelo chão, fazendo as vezes de dono da casa. Era reclamão e não gostava de ficar sozinho: quando se sentia incomodado, piava alto até ser atendido. Nessas horas, Tia Eddinha gritava: "Lyyyyydia, vá ver o que Patrick quer!". E ele era atendido. Taí, acho que poucos passarinhos tiveram uma vida tão feliz. Foi amado por aqueles três, mesmo quando a gaiola tava suja - quem precisa de gaiola quando se tem tanto amor e carinho e uma casa inteira?


Imagem figurativa, mas igualzinha ao Patrick original

Ontem foi o último dia da vida de Patrick. Recebi uma ligação internacional de Juliana, minha irmã, contando do falecimento do penado. Ah, e foi triste, gente. Patrick é da família, cantarolava o hino nacional bem afinadinho e tinha as asas encardidas (claro, branco como era, não podia ficar de outro jeito, andando no meio dos meninos). Ontem, ele estava no meio dos meninos de novo, como sempre estava, apesar do risco. Mas há sempre riscos na felicidade; Nem sempre ela custa pouco, mas quero ver quem quer abrir mão dela. Quem quer ser feliz, não abre mão de pagar preços pela própria felicidade e daqueles a quem ama.

Acho que, na verdade, Patrick morreu foi de felicidade. E os meus primos aproveitaram o companheiro até o fim. Mas é assim... eu tenho uma amiga que sempre repete que "saudade é um preço que se paga por momentos bem vividos". Nem sempre sem a sutil dor da perda.