terça-feira, 1 de março de 2011

A sutil dor da perda

Desde cedo, eu aprendi a "perder". Quando tinha sete anos, um dos meus tios paternos morreu em um acidente de carro. Marcelo tinha 18 anos, era lindo, sorridente, ia prestar vestibular pra Jornalismo. Eu, no alto dos meus sete anos, achava que ele era grande e que a morte era "normal pra gente grande". Eu nem cogitava que ele era tão criança quanto eu.

Naquele episódio, eu me lembro bem, pra nunca esquecer, teve muita dor. Vovó me marcou muito. O choro dela carregava dor e desolação, de quem queria ter protegido e não pôde. Nem poderia... ninguém podia fazer nada. Era o dia de Marcelo, sabe-se lá o porquê, mas era. Sempre tive certeza disso, mesmo no tempo de católica praticante: as coisas terminam exatamente no momento certo. Lembro que na época, fiquei duplamente triste, já que ficara sem festa de aniversário de sete anos. De 16 de junho para 20 de julho, o tempo era curto demais e as feridas estavam todas lá, abertas. Mas ele morreu feliz, viajando com os amigos. Tenho certeza.

Eu cresci lidando com perdas e ganhos, consciliando frustrações e vitórias. O próprio Jornalismo me ensinou isso e me relembra todos os dias. Mas tudo é mais fácil de administrar que a morte - embora não devesse. A morte dá a sensação de fim, sem poréns, sem muita chance pra frustação. Inês já era.

Vi pouca gente ir embora, até hoje. Tio Marcelo foi o primeiro. Em seguida, minhas bisavós, Clarice e Helena - nada mais natural. Anos depois, quando eu já estava adulta, foi vovó Edda, meu doce de banana favorito. Mas a perda de vovó foi leve, ela não me deixou nada que não fosse bom, gostoso e engraçado. Foi dos personagens mais simbólicos do meu início e eu seria incapaz de chorar por causa dela - vovó era riso demais pra merecer lágrimas. Pra ela, sempre, todos os sorrisos.

Mas, então...

Esse post é pra falar de algo interessante e triste que aconteceu hoje. Tenho três primos adoráveis, a quem amo muito, que moram em João Pessoa. Lydia, Samuel e Lucas são daqueles indispensáveis na vida da família. A casa, em dias de festa, fica vazia demais sem eles três (e olhe que somos nove!).

Eles criaram por anos uma calopsita branca cheia de personalidade. Sou capaz de apostar que Patrick (ou "Pratick", como Lucas chamava, mais novinho) pensava que era cachorro e depois se sentia o caçula da família. Andava livremente pelo chão, fazendo as vezes de dono da casa. Era reclamão e não gostava de ficar sozinho: quando se sentia incomodado, piava alto até ser atendido. Nessas horas, Tia Eddinha gritava: "Lyyyyydia, vá ver o que Patrick quer!". E ele era atendido. Taí, acho que poucos passarinhos tiveram uma vida tão feliz. Foi amado por aqueles três, mesmo quando a gaiola tava suja - quem precisa de gaiola quando se tem tanto amor e carinho e uma casa inteira?


Imagem figurativa, mas igualzinha ao Patrick original

Ontem foi o último dia da vida de Patrick. Recebi uma ligação internacional de Juliana, minha irmã, contando do falecimento do penado. Ah, e foi triste, gente. Patrick é da família, cantarolava o hino nacional bem afinadinho e tinha as asas encardidas (claro, branco como era, não podia ficar de outro jeito, andando no meio dos meninos). Ontem, ele estava no meio dos meninos de novo, como sempre estava, apesar do risco. Mas há sempre riscos na felicidade; Nem sempre ela custa pouco, mas quero ver quem quer abrir mão dela. Quem quer ser feliz, não abre mão de pagar preços pela própria felicidade e daqueles a quem ama.

Acho que, na verdade, Patrick morreu foi de felicidade. E os meus primos aproveitaram o companheiro até o fim. Mas é assim... eu tenho uma amiga que sempre repete que "saudade é um preço que se paga por momentos bem vividos". Nem sempre sem a sutil dor da perda.

2 comentários:

Edda disse...

Amei, estamos tristes, mas foi exatamente isto que disse aos meninos, Patrick não poderia ter sido mais feliz.
Amo você,
beijos,
Tia Eddinha

Tacyana Viard disse...

É fogo. Uma coisinha tão pequena nos alegra tanto. Eu tenho medo e perder alguém ou algum bicho. Pânico. É horrível e imaturo, sei. Ainda aprenderei.

Massa, mamute.