quinta-feira, 4 de março de 2010

Estamos no caminho...

Estamos, alguns, na luta insistente de debater o ideal; mesmo sabendo que o embate será eterno. Sempre haverá o real para se sobressair ao pobre e raquítico idealismo e suas correções. Só não quero, mais tarde, ao olhar num espelho, perceber que o idealista de testa franzida e discursos firmes virou um conformista empoeirado e lacônico, daquele que repete, como um vinil velho: “é assim mesmo”. 

Abaixo, um texto assinado por Alberto Dines, que exerce o jornalismo há anos.


EDIR MACEDO
Bispo quer a carteirinha de jornalista

Por Alberto Dines em 2/3/2010

O bispo-empresário Edir Macedo insiste em ser jornalista. É dono de uma poderosa rede de TV, tem concessões para dezenas de emissoras de rádio, pode dizer o que quer, enganar, subtrair, distorcer, criar fatos e factóides. Mas não está satisfeito. Quer uma carteirinha de jornalista. Para atender suas angústias existenciais ou ganhar convite para as estréias de filmes.

Apelou para a justiça em 2001, conseguiu ser admitido como jornalista-colaborador e em agosto de 2009, depois de o Supremo Tribunal Federal acabar com a obrigatoriedade do diploma para o exercício do jornalismo, entrou com uma ação no Tribunal Regional Federal da 2ª Região. O desembargador Fernando Marques o atendeu.

Errou o meritíssimo, data vênia: a entidade à qual Edir Macedo pretende associar-se (o Sindicato dos Jornalistas Profissionais do Município do Rio de Janeiro) é composta exclusivamente por trabalhadores. Na condição de patrão, empregador – e aqui não vai nenhum juízo de valor –, Macedo não pode pretender a defesa dos interesses dos empregados. É incompatível.

Sindicato é, segundo o dicionário Houaiss, uma...

"...associação, para fins de estudo, defesa e coordenação de seus interesses econômicos e/ou profissionais, de todos os que (na qualidade de empregados, empregadores, agentes ou trabalhadores autônomos ou profissionais liberais) exerçam a mesma atividade ou atividades similares ou conexas."

Edir Macedo tem todo o direito de associar-se a um sindicato de empresas ou empresários. São seus iguais, conexos. Suas atividades e funções na Rede Record (ou em qualquer outro veículo do seu grupo) não são similares às dos demais funcionários. A começar pelo poder de admitir ou demitir que o colocam em posição desconexa frente aos demais companheiros.

Especificidade liquidada

Absorvido pelas novidades aportadas pela decisão do STF no tocante ao diploma, o magistrado passou ao largo dos condicionantes ontológicos e morfológicos de uma entidade sindical. A guilde francesa, guild inglesa ou gilde alemã eram corporações de artesões formadas na Idade Média, organicamente coesas e obrigatoriamente uniformes.

Segundo o mesmo Houaiss, corporação é um...

"...conjunto de pessoas que apresentam alguma afinidade profissional, de idéias etc., organizadas em uma associação e sujeitas ao mesmo estatuto ou regulamento... Organismo social que reúne os membros de uma mesma profissão".

A um comerciante de vinhos jamais ocorreria associar-se a uma corporação de vinhateiros. Um vende, o outro produz, ambos lidam com vinhos mas em diferentes posições do processo, com interesses divergentes.

Mesmo que Edir Macedo seja capaz de redigir corretamente um texto de 10 linhas como as centenas de jornalistas aos quais paga salários, o simples fato de ser o detentor de um meio de produção (e representar o capital), coloca-o em posição diametralmente oposta à daqueles que representam o trabalho. Não são categorias melhores ou piores – são diferentes, radicalmente diferentes.

Ao justificar a extinção da exigência do diploma, o ministro Gilmar Mendes do STF tentou ir além e liquidou a especificidade de uma profissão com registros históricos que remontam ao Império Romano. Agora, o egrégio Tribunal Regional Federal da 2ª Região avança na dissolução de um sindicato e anula sua definição e função social.

Estamos no bom caminho...

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