Eu não gosto de usar o já cansado termo "contraste" para descrever disparidades gritantes e seus metros quadrados, mas preciso admitir que, para este caso, o vocábulo é bem propício. Então, todas as vezes que você ouvir falar em "contrastes", pense imediatamente em Pernambuco. Estado que mais cresce no País, que cresce mais que o País, mas que consegue cultivar todas as discrepâncias que se espera de um rico em ascensão.
Nos cinco dias que estivemos (a repórter fotográfica Andréa Rego Barros, o motorista Raimundo Nonato e eu) percorrendo um traçado de estrada até Palmares, eu descobri um Pernambuco diferente daquele cantado em pautas no Palácio do Campo das Princesas, a sede oficial do Governo. E não é um sentimento de imediatismo que me decepciona. Ontem, decupando a fita com entrevista da assessora especial do prefeito de Ipojuca, Simone Osias, fiquei refletindo quando ela disse: "Quando chegamos aqui, em 2005, Suape já exista há mais de 20 anos e Porto de Galinhas, há 19 anos. Então fomos pra rua saber o motivo pelo qual as pessoas continuavam pobres". Faltava educação, deficit que continua.
As cidades do interior, que antes eram simples e pacatas, hoje têm aspecto de favela. E nem falo de Barreiros e Palmares, que estão ainda se recuperando das águas de junho, que arrancaram e destruíram tudo o que havia pela frente. A natureza não foi tão cruel em Escada e, afirmo, nunca vi cidade mais feia, maltratada e favelizada. Em Ribeirão, nem um lugar limpo para passar a noite encontramos - as únicas pousadas da cidade, três ou quatro, não tinham a menor condição de receber esse nome. São sujas, feias, cheiram mal.
Lembrei também de outro entrevistado, o economista ecológico Clóvis Cavalcanti. Eu estava fazendo uma especial sobre sustentabilidade, em outubro passado, e o questionei sobre o desenvolvimento do Estado, ao que ele respondeu: "é a mesma lógica da célula cancerígena, que cresce por crescer". É a melhor explicação. Ainda estou analisando os dados.
Lembrei também de outro entrevistado, o economista ecológico Clóvis Cavalcanti. Eu estava fazendo uma especial sobre sustentabilidade, em outubro passado, e o questionei sobre o desenvolvimento do Estado, ao que ele respondeu: "é a mesma lógica da célula cancerígena, que cresce por crescer". É a melhor explicação. Ainda estou analisando os dados.
O melhor da minha profissão é o aprendizado diário, rotineiro. Diariamente, eu vejo coisas novas, mas, principalmente, todos os dias eu mudo de ideia. Todos os dias, há nova contagens, novas cifras e motivos de esperança e de revolta. A injustiça é muito grande e eu ainda tenho a inocência de me surpreender quando vejo alguém que chama de esperteza o que é oportunismo.
Pernambuco cresce, sim. O censo do IBGE já mostra o aumento da renda percapita, do Índice de Desenvolvimento Humano (IDH), mas os números são muito mais generosos que o que se vê. O que temos é um crescimento atropelado, "com índices chineses", mas não estamos na China. Quando se para para conversar com as pessoas nas ruas, quando se questiona prefeitos, se percebe que este é apenas o começo. Bate uma desesperança. Desenvolvimento concreto é aquele que abre escolas, asfalta ruas, equipa hospitais e dá dignidade - não é só movido à indústrias.
Um comentário:
O mito do desenvolvimento por Celso Furtado.
[...] a idéia de que os povos pobres podem algum dia desfrutar das formas de vida dos atuais países ricos - é simplesmente irrealizável. sabemos agora de forma irrefutável que as economias da periferia nunca serão desenvolvidas, no sentido de similares ás economias que formam o atual centro do sistema capitalista. Mas, como desconhecer que essa idéia tenha sido de grande utilidade para mobilizar os povos da pariferia e levá-los a aceitar enormes sacrifícios para legitimar a destruição de formas de culturas arcaicas, para explicar e fazer compreender a necessidade de destruir o meio físico, para justificar formas de dependência que reforçam o caráter predatório do sistema produtivo? Cabe, ortanto, afirmar que a idéia de desenvolvimento é um simples mito. Graças a ela, tem sido possível desviar as atenções da tarefa básica de identificação das necessidades fundamentais da coletividade e das possibilidades que abrem ao homem o avanço da ciência, para concentrá-los em objetivos abstratos, como são os investimentos, as exportações e o crescimento". (FURTADO, 2001, p.88-89).
"Desenvolvimento concreto é aquele que abre escolas, asfalta ruas, equipa hospitais e dá dignidade - não é só movido à indústria". (NOTARO, 2011)
Que afinidade: Tatiana Notaro e Celso Furtado. Por isso, quando posso leio o que essa menina escreve.
O próximo navio a sair do estaleiro, em pernambuco, vai ter o nome desse homem aí.
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