sábado, 28 de janeiro de 2012

"Anjo pornográfico" - trechos

Vestido de noiva


"Depois de praticamente inventar o teatro brasileiro, o autor de 'Vestido de noiva' viu-se na avenida Rio Branco, escura e deserta, caminhando feito um zumbi em direção à leiteria Palmira, no largo do Carioca. Ele, sua mulher, sua cunhada Julieta e sua sogra foram comer o 'jantar Avenida' da leiteria: bife, batata frita e dois ovos. (Pediu pão por fora.) O resto do elenco fora comemorar na chique sorveteria 'A brasileira', na Cinelândia.

E sabe porque Nelson não foi com os outros para 'A brasileira'? Porque não tinha dinheiro.

Não lhe faltaria, evidentemente, quem disputasse a primazia de pagar por ele. Mas, naquele momento, ainda não se dera conta de que, fechado o pano de 'Vestido de noiva', ele deixara de ser o miserável que se tornara desde a morte de Roberto*.

A morte de Roberto. Quando Nelson pegou o bonde e volta para a praça Bandeira, já eram quase duas da manhã de 29 de dezembro de 1943. Sem tirar nem pôr - nem um dia, nem uma hora, talvez nem um minuto - completavam-se catorze anos que seu irmão morrera."

Livro de Ruy Castro
*Roberto Rodrigues, um dos irmãos mais velhos de Nelson, que fora assassinado pela recém-desquitada Sylvia Seraphim. Digamos que estava de pé no lugar errado, na hora errada. O tiro foi fatal.

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