Ser popular no Brasil não parece ser tarefa das mais árduas – vide a lotação em apresentações de bandas dispensáveis e de pouco talento que formam e renovam os ciclos efêmeros da música nacional que oscila entre lambada, pagode, funk, brega; que da mesma forma que são ostentados, despencam. Ser popular no Brasil, de fato, é resistir à efeméride músical, ao tempo.
E ir a um show do grupo carioca Roupa Nova é, antes de tudo, assumir-se um dos últimos românticos e chegar com a certeza de saber pelo menos parte do repertório, senão todo. Músicas do tipo que você já ouviu muito, mas não tem a menor ideia onde. Antes de tudo, é preciso estar disposto a assumir seu lado cafona, despretenciosamente poético, corajosamente ridículo.
O Roupa Nova completou 31 anos de uma carreira linear, popular à base de uma fórmula comum, mas ainda não cansada. Aparentemente. Atrai muita gente, agrada e envolve, principalmente pela capacidade de reviver, o que é muito fácil para um grupo cujo repertório mantém-se igual e ainda respaldado por novelas “globais”. A receita parece não ter erro: narrativas de amores ultraromânticos, espaço no horário nobre e público saudosista; números conquistados ao logo das mais de três décadas de vida, set list vasto e um Grammy Latino, em 2009. Aos que torcem o nariz ao repertório meloso da banda, fica o desafio de ouvir e provar que não sabe sequer uma das composições distribuídas em 22 álbuns.
O péssimo da noite foi a insistente falta de estrutura do Recife e RMR (Região Metropolitana), que não conseguem sequer ter dois eventos simultâneos no espaço do Centro de Convenções (Cecon) e o calor incorrigível do Chevrolet Hall lotado. E por causa de mais de uma hora em um engarrafamento lento, perdemos a primeira atração da noite, o show de Guilherme Arantes. Quando entramos no Chevrolet, ele já cantava a última música – como não voltou, acredito que já fosse o “bis”.
Chevrolet cheio. Quarenta minutos e muita propaganda depois, Roupa Nova entra na cena e derrama sua primeira leva de músicas-de-trilha-de-novela. Não em tom de crítica. Era exatamente o que todo mundo ali queria ver. Embora desafine gritantemente, o grupo é harmonioso entre si e tem um carisma que eu não dimensionava até então. Tem um público (muito) diverso, conquistado há tempos, que acompanha e entra no clima da noite.
O show, comemorativo aos 30 anos, tem três “participações especiais”. No telão, os seis integrantes interagem com Milton Nascimento (em “Bailes da vida”), Sandy (em “Chuva de prata”) e ainda com o Padre Fábio de Melo (!!). A certa altura, eles “puxam” uma homenagem totalmente desnecessária às mulheres. Desnecessária porque o romantismo, por si só, já é uma característica arraigada ao feminino; desnecessária porque, se é pra fazer, que se faça direito. Com os “(d)efeitos especiais” – uma seleção de fotos que misturou Elis Regina, Yoko Ono, Lady Di, Oprah Winfrey, ita Lee –, o momento ficou deslocado e excessivamente cafona. Fez a linha apresentação de Power point.
Ademais, dentro das efemeridades da música brasileira, há de se reconhecer as conquistas do grupo. Roupa Nova tem no repertório mais de 30 temas de novelas, em 22 álbuns gravados ao longo da carreira. Cleberson (pianos e vocais), Feghali (teclado, violão e vocais), Kiko (guitarra, violão e vocais), Nando (baixo e voz), Paulinho (percussão e voz) e Serginho (voz e bateria) são indiscutivelmente carismáticos e não têm qualquer pudor de cantar todos os lugares comuns das relações, com direito a mão no peito, olhos fechados e agudos contínuos e até declarações rasgadas de amor ao público. Show bom para um repertório consolidado. Sem fórmulas mágicas.
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