quarta-feira, 18 de janeiro de 2012

Fragmentos (1)

Mastigar bem esta vida é a primeira lição para não morrer engasgado. Os dias passam, viram anos bem rápido e você só vai ter tempo de  aprender uma página de cada vez. Ou aprende, ou a lição vai se repetir lá na frente. Invariavelmente.

Tornei-me homem cedo. Fui pai cedo e não tive outra saída. Dali a meses, minha vida mudou totalmente. Era a hora de pôr a cabeça no lugar, mas o que eu fiz foi ter outro filho. Aos 20 e poucos, tinha mais duas bocas, além da minha, para alimentar. Fazia-me de bom filho para parecer bom pai, mas, na verdade, só conseguia ser bom profissional. A vida boêmia também ia bem e a oficial se desfez.

Mas o pontilhar do meu trajeto era tão frouxo, tão irracional, que eu fui incapaz de voltar à casa um, jogar os dados e jogar do mesmo jeito. A ponto de. Anos depois, lá estava eu: bem acima do peso, mais velho que meu RG mostrava, muito mais boêmio que poderia cogitar. Hoje, faço planos porque planejo morrer cedo e não posso deixar todas essas bocas desamparadas.

Tornei-me também uma mulher sozinha. Arrumei tantas brigas, disse tantos impropérios que só consegui desfazer laços. Hoje vivo em um nó. Pego-me lembrando de quando as netas eram crianças e fazia parte do roteiro que meus filhos as trouxessem para mim. Da dama que fui, seguiu-se um casamento forçado, mais filhos que os dedos de uma mão, mortes, agouros e uma língua ferina. Dela, sobrou pouco de mim. Só me reconheço nas fotos da parede: dali eu ainda posso ser o que queria ter sido. Eu era muito.

(continua, qualquer dia breve.)

Um comentário:

A Torre Mágica | Pedro Antônio de Oliveira disse...

Muito bom! Preciso aprender umas coisinhas com esse texto (rsrs).

AbraçãoO!

Pedro Antônio