segunda-feira, 25 de fevereiro de 2013

Segunda vez no ano


Lá vinha eu, 22h, voltando pra casa depois de um dia econômico de trabalho, quando ouço um estralo na embreagem do carro. Quebrou, desencaixou ou qualquer coisa parecida, mas o fato é que, pela segunda vez no ano, meu companheiro de quatro rodas me deixou na mão. E foi em um momento bem chato, em uma hora complicada, quando eu só queria chegar ao meu destino.

- Faça isso não, Cascão. Tem IPVA mês que vem... - tentei dialogar.

Liguei pro seguro, pra mãe e fiquei desolada esperando o guincho. Fiquei olhando pra ele  que olhava pra mim cabisbaixo, com o pisca-alerta ligado. Parecia pedir desculpas por me deixar na mão, de novo, pela segunda vez no ano. 

- Gastei mais de R$ 1 mil em você este mês, te dei banho, troquei óleo, abasteci com gasolina aditivada, e você me faz isso? - pensava. E ele só piscava, pedindo perdão pela ingrata atitude.

A mãe chegou, reclamou dos meus palavrões, da minha cara revoltada de quem tinha sido abandonada pela segunda vez no ano. O guincho chegou, o amarrou, puxou, e eu fiquei com um nó na garganta. Pensava no prejuízo que tive, se caberia outro no orçamento - junto com o IPVA (e uma multa) - e se eu teria mesmo que substitui-lo. Chegou a hora? Afinal, ninguém quer se desfazer de algo que deixará, invariavelmente, lembranças boas. Mesmo que cause ônus hoje, mesmo que sejam dias de oficina, de rotina mudada; mesmo que venha uma conta alta. 

Ninguém quer abrir mão daquilo que sabe que funciona na estrada, que consome pouco combustível, que é companheiro de horas de trânsito, que é (e foi) testemunha de tanta coisa. Meu Cascão já foi ambulância, a limousine que levou minha irmã para a noite de núpcias, caminhão de mudança e até já ajudou em obra, carregando cimento.

É carro de jornalista: vive cheio de edições velhas da Folha pelo banco traseiro; quebra pela segunda vez no ano e vira assunto na redação. É carro de quem ama música, de quem vive com os amigos, de quem é o amigo da vez. É carro de quem ama carro e por isso tem quase 60 mil quilômetros rodados. Conhece itinerários nas zonas Sul, Norte, Oeste do Recife, em Garanhuns, Natal, Jaboatão, Serrambi, Tamandaré, João Pessoa, nas ladeiras de Olinda e nas ruas do Recife Antigo, onde roda todo dia, incansavelmente, até encontrar uma vaga honesta.

Hoje eu o vi ser guinchado de novo, quebrado pela segunda vez no ano. Fiquei olhando sumir na rua, sendo guiado por alguém que não era eu. E mesmo pensando que terei prejuízo de novo, pela segunda vez no ano, olhei pra o meu Ka KJO8096 e prometi que vou tentar de novo.


PS: Painho, Cascão quebrou de novo!

4 comentários:

Anônimo disse...

Pra que foi dá banho em Cascão, Tatiana?!
Ele reclama como pode. :-)

PS: Há tempos andei por aqui e hoje, sabe-se lá porque, vim lhe fazer uma visita.

Abraço.
Zé Henrique

Tatiana Notaro disse...

Bom vê-lo de novo por aqui, Zé!
=) apareça sempre

Anônimo disse...

Massa, Tatiana!
Aparecerei.

PS: Gosto de quem tem boa memória. :-)

Zé Henrique

Unknown disse...

Amei! Declaração de amor escancarada ao Cascão! Abs!