Retrato do artista quando jovem
DVD do Barão Vermelho no Rock in Rio mostra o poeta Cazuza belo e saudável
Pedro Ferrer
Especial para a Folha
Há três anos, quando o filme “Cazuza - O Tempo Não Pára” chegou às telas de todo o Brasil, a nova geração pôde conhecer um pouco mais da história do cantor e compositor Cazuza, morto em 1990, aos 32 anos, em decorrência do vírus da Aids. Para quem só lembra dele com o rosto já marcado pela doença, o cabelo ralo e o corpo esquálido, é importante que se diga que - um dia - Cazuza foi belo e saudável como qualquer um de nós e que sua música já tinha força. E isso é comprovado no DVD “Rock in Rio - Barão Vermelho 1985”, que acaba de chegar às lojas via Som Livre/MZA Music. O show flagra a banda num momento histórico.
O Barão Vermelho daquela época era um quinteto formado ainda por Frejat, Guto Goffi, Maurício Barros e Dé Palmeira. O primeiro, como todos sabem, assumiu os vocais da banda com a saída de Cazuza, no mesmo ano de 1985. Guto e Maurício continuam na banda. Dé, por sua vez, trabalha há um bom tempo com Adriana Calcanhotto. Mas os quatro, e mais o produtor Ezequiel Neves, se reúnem no ótimo documentário “Aconteceu em 1985”, um dos extras do DVD. Entre lembranças daquela apresentação, eles falam do sentimento de patriotismo que pairava no ar. Também aparecem Lucinha Araújo, mãe de Cazuza, e a jornalista Leda Nagle, que na época era um dos nomes mais importantes da TV Globo e entrevistava as atrações do festival.
E o que se vê no palco é mesmo uma festa. Estourada em todo o Brasil com “Maior Abandonado”, a banda enfileira vários hits, para deleite da platéia, também repleta de bandeiras do Brasil. Além de festejar o momento político, a impressão que se tem é que o público está dando seu aval para o rock brazuca, que naquele festival - rivalizando com atrações do porte do Queen - começava a se estabelecer como a principal forma de expressão musical do País. Basta prestar atenção à vibração da platéia, toda vez que o Barão Vermelho inicia os acordes de hits como “Bete Balanço”, “Subproduto do Rock”, “Todo Amor que Houver Nessa Vida”, “Baby Suporte” e “Por Que a Gente é Assim”.
Esse mesmo show foi mostrado no Recife, em março do mesmo ano. Num Geraldão lotado, Cazuza fez todas as diabruras a que tinha direito. E a resposta do público não poderia ser melhor: todo o ginásio cantou e dançou “Pro Dia Nascer Feliz”. Poucos meses depois, Cazuza - com a certeza de que já tinha ficado maior que aquilo tudo - partiu para a carreira solo, lançando “Exagerado”. O Barão, apesar do baque inicial, seguiu adiante, estabilizando-se como uma das principais bandas de rock do País. Cazuza - já debilitado pela doença - voltou ao Recife em novembro de 1988, para mostrar o belo show “Ideologia” a um Teatro Guararapes abarrotado. A platéia acompanhava em coro as então já clássicas “Faz Parte do Meu Show”, “Vida Louca Vida” e “Brasil”, que naquele momento era tema da histórica novela “Vale Tudo”, na voz de Gal Costa, e virou uma espécie de hino às avessas.
No comecinho de 1989, o cantor ainda apareceu na cidade para uma apresentação no Pavilhão do Centro de Convenções. Mas, infelizmente, não conseguiu se manter firme no palco. Em abril, sua imagem na capa da Veja, sob o título “Cazuza: Uma vítima da Aids agoniza em praça pública”, deixou o Brasil em estado de choque. Artistas fizeram um abaixo-assinado contra a revista. Mas o fato é que Cazuza foi extremente corajoso ao se expor daquela maneira, numa época em que a doença ainda era motivo de muita intolerância (se hoje ainda é, imaginem há 18 anos). Cazuza morreu em 1990, mas as suas canções sobrevivem e, o que mais impressiona, continuam atuais. Com o lançamento do DVD “Rock in Rio - Barão Vermelho 1985” - que também sai em CD -, sua “pré-história” finalmente é resgatada. Sem sombra da doença, vemos um Cazuza lindo, forte, provocante, pedindo “Pro Dia Nascer Feliz” naquele ano de tantas mudanças. Para ele próprio, para o público e para o Brasil.
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