sexta-feira, 2 de outubro de 2009

O jornalismo e a dor alheia

Fiquei vários dias refletindo sobre uma foto que vi no site do Estadão. Quando a vi, ela acabou com o meu dia, de tanta tristeza que conseguiu transmitir.

O assunto é o seguinte: tá lembrado daquela explosão que aconteceu em Santo André/SP, no dia 24 de setembro, em que duas pessoas morreram, 12 ficaram feridas e 100 ficaram desalojadas? Pois bem. Uma dessas pessoas era a dona Maria de Oliveira Martins, 58 anos.

A reportagem do Estadão foi até o enterro, que aconteceu no fim da manhã da sexta-feira, 25,  no cemitério Parque das Nações. Quando vi essa foto, fiquei bem perplexa. Ela passou a semana toda salva entre as abas do firefox, enquanto eu pensava o que pensar sobre ela.

Infelizmente, ainda não cheguei a nenhuma conclusão. Afeta. Fiquei pensando na necessidade do registro, que causou manifestações solidárias dos leitores, que deixaram comentários sobre a matéria.

Lembrei-me do teórico Francisco Karam, que no livro "Jornalismo, ética e liberdade" diz seguinte:


É necessário, no entanto, dizer que o jornalismo não pode conviver somente com “as coisas belas da vida’. Precisa tratar das tragédias que essa mesma vida carrega, para, inclusive, valorizar as consideradas grandiosas. Os valores sociais só podem ser sentidos, tanto pela razão como pela paixão e emoção, se estiveram ligados socialmente à diversidade em que se expressam. Do contrário, se houvesse só beleza, a própria palavra não teria sentido de existir, já que não haveria nada possível de ser nomeado fora dela. Seria uma redundância. Se há coisas que não são da esfera do belo, do útil, do prazer, é porque há algo passível de ser considerado feio, inútil ou doloroso. O universo do jornalismo precisa lidar com isso, é da sua essência, é para isso que existe, não para esconder as coisas do mundo.


Há verdade, mas eu não concordo totalmente. Sim, é papel do jornalismo relatar. Discuto apenas a forma como isso é feito, e por qual propósito.













O marido de Ana Maria, José Carlos Martins, de 64 anos, se emocionou muito durante o enterro. O filho do casal, Francisco Oliveira, de 26 anos, também estava presente. Ela trabalhava na casa nos fundos da loja de artifícios quando aconteceu a explosão. Ela trabalhava para a família de Sandro Luiz Castellani. (do site do Estadão)


O dono da loja de fogos, Sandro Luiz Castellani, foi visto fugindo no momento da explosão. Segundo reportagem exibida no Jornal Nacional, Sandro já foi preso em 2002 por posse ilegal de fogos de artifício, mas agora tinha autorização da polícia para vender o produto (mas não da prefeitura de Santo André). Ainda segundo a reportagem, em abril deste ano, fiscais chegaram a vistoriar a loja depois de denúncias da vizinhança. O secretário de habitação de Santo André, Frederico Murano, disse ao repórter do JN que, quando a fiscalização foi feita, nada foi encontrado.

Além da esposa do sr. José Carlos, Denian Castelani, primo do dono da loja, também morreu na explosão. Segundo o G1, "o comerciante Sandro Castelani e a mulher dele não estiveram no enterro. Eles desapareceram na tarde de quinta-feira, logo depois da explosão". Sandro vai responder por dois homicídios, lesões corporais, danos materiais e o chamado crime de explosão, que coloca em risco vidas e patrimônio. No dia 28 de setembro, o empresário começou a prestar depoimento sobre o acidente.

6 comentários:

Juliana Notaro disse...

Gostei muito do que você postou. Tive que realmente parar para pensar no que eu achava sobre tudo isso. Acho que se sr. José Carlos fosse contra a publicação da foto dele, seria errado o jornal publicar. Por outro lado, eu acho que as vezes essas coisas precisam ser mostradas para mobilizar a sociedade e as autoridades... a dor alheia também deve ser dividida, não só as alegrias.

KETY MARINHO disse...

A boa e máxima: de alguma coisa nós vamos morrer!
Afinal tudo o que vive, morre.
Sofrer por/com isso é comum.
Somos comuns.
Bem comuns.
E a lágrima tem o mesmo gosto.
Amargo - seco - salgado - nervoso
No contra-senso dos sentidos: chora QUEM fica VIVO...

Anônimo disse...

Fala, Tatiana, vim dar mais um passeio pelas suas plagas.
Chiquinho falou o óbvio ululante - como diria Nelson Rodrigues - é por isso que ele é teórico. ehehehehe
Quanto a sua opinião. Já pensou em ser ombudsman?
Outro dia na Folha SP tinha alguns baluartes do jornalismo falando o que precisava pra ser ombudsman.
Um desses figurões - ex-ombdsman da Folha - disse que era preciso um certo grau de ingenuidade. :>)

PS: Quero muito ver o dia em que os jornais vão usar, ao lado do "erramos", o "metimos". ehehehehe

Um abraço, mocinha.
Ahhh, mande um abraço pra sua voinha tb.
Fale baixo, ela ouve tudo! hauauauauha

José Henrique

Anônimo disse...

Consertando - Mentimos.
Putzz, errei. Mas não menti. :>)))))))

Marcos Nunes Filho disse...

Prezado "Anônimo" José Henrique,

Na matéria publicada por Tatiana se discute valores, crenças, questões éticas e aquilo que aflige cada ser que vive, pensa , sente e respeita, sobretudo, o que acontece com o próximo.

Fala-se de transgressão, fala-se de desrespeito à integridade, à vida. Tem conteúdo de humanidade, de seriedade, de compaixão ao próximo iguais a nós, talvez igual a você, infortunados por tragédias que poderiam ter sido evitadas.

Lamentável sua sordidez desconstrutiva, sua ironia para encobrir uma pseudo-inteligência e de um raquítico sentimento ao próximo. Você nem é um Diogo Mainardi, outro cidadão que se autoenobrece com sarcasmos babacas. O que você faz de concreto e construtivo, José? Ou você é o "José" de Carlos Drumond que tá procurando uma saída? E nessa busca, bate com a cara no poste e ironiza um assunto tão sério. Tomara que você se encontre. José. Torço por isso. Não temos tempo a perder com essa futilidade toda.

Precisamos nos esforçar para melhorar o coletivo, mas o coletivo é composto por indivíduos, anônimo José.

Marcos Nunes
nunessfilho@yahoo.com.br

Anônimo disse...

Nossa, brother.
Pra que tudo isso?!
Não ironzei a dor do velhinho. Jamais faria isso! A foto tb me sensibilizou.
O que ironizei, ironizo e ironozarei foi a Tatiana ter discutido o papel da imprensa.
Já faz muito tempo que eu deixei de acreditar em Papai Noel.
Não procuro uma saída, porque simplesmente ela não existe. Quanto a me encontrar, estou ancho - na medida do possível - nesse planetinha.
Já em relação ao coletivo. Realmente, cara, nunca dei muito valor pra ele, acho chato, sem rosto e não raras vezes burro.
Prefiro o indíviduo, mesmo correndo o risco de encontrar gente séria demais e chata, como vc.

PS: Diogo Mainardi foi pesado, hein?
Não sei quem é mais F.D.P se a VEJA ou ele.

Um abraço e fique mais relax, bicho.

"Se eu for pensar muito na vida
Morro cedo, amor..." Nelson Cavaquinho

José Henrique Miranda